Levantamento feito pelo Correio com 152 escolas filiadas ao Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do DF (Sinepe-DF) mostra que 72% dos colégios de ensinos fundamental e médio têm práticas religiosas (o índice representa 56 instituições).
O Brasil, as unidades da Federação e os municípios são laicos. O artigo 19 da Constituição proíbe o estabelecimento de qualquer relação de dependência ou até aliança de governos e órgãos públicos com igrejas ou cultos religiosos. O direito individual de ter ou não religião também aparece na mesma lei. O artigo 5º garante como “inviolável a liberdade de consciência e de crença”. A realidade é bem diferente, no entanto, para os pais de crianças e adolescentes do Distrito Federal quando em jogo está a escolha da escola particular para os filhos.
A instituição privada tem direito a adotar publicamente uma crença religiosa ou se vincular a uma congregação — católica ou protestante. Mas precisa se submeter à lei máxima, ou seja, não pode restringir o acesso a estudantes que professem a mesma fé nem impor suas convicções a pais e alunos. Levantamento feito pelo Correio com todas as 152 escolas filiadas ao Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do DF (Sinepe-DF) mostra que 72% dos colégios só de ensino fundamental ou de ensinos fundamental e médio têm práticas religiosas (o índice representa 56 instituições). Na sondagem, foram descartadas as escolas de ensinos infantil e profissionalizante. Com o corte, avaliaram-se as ofertas de 78 centros de ensino, considerando apenas as matrizes. É o caso do Colégio La Salle, que aparece quatro vezes na lista de filiados no Sinepe, mas apenas uma no levantamento do Correio.
Em quase metade dos casos, a própria instituição se define como confessional — a que elege publicamente o credo — e filantrópica. No restante, a palavra de Deus aparece de forma discreta em uma oração no início da aula ou na hora de comer a merenda. A relação de religião e educação incomoda o funcionário público Arthur Passos da Silva, de 45 anos. “Queria um colégio perto de casa e de qualidade. Só encontrei escolas religiosas e acabei matriculando o David em uma escola mais longe”, conta o pai do adolescente de 14 anos. “Hoje, ele vai e volta de transporte escolar”, completa.
A postura mais radical do pai é rara, de acordo com o professor de ensino religioso do Colégio Santo Antônio Francisco de Matos Barros. “A religião é uma forma de passar valores importantes para a meninada. Nem todas as famílias com crianças matriculadas aqui são católicas”, diz o professor. “Explicamos aos pais que o conteúdo ajuda a formar um cidadão melhor.”
Sem proselitismo
Nas aulas de ensino religioso do colégio são tomados alguns cuidados. Nem Francisco nem os outros dois professores de ensino religioso usam correntes com medalhas de Nossa Senhora ou qualquer imagem de santo. Também não é comum vê-los falando do catolicismo. A lei de Diretrizes e Bases da Educação proíbe o proselitismo, ou seja, não permite que docentes façam propaganda de religiões em sala de aula. Na lei, porém, não há referências a imagens ou textos de orações espalhados pelos centros educacionais. No Colégio Santo Antônio, por exemplo, cartazes com o desenho de um frei franciscano apresentam palavras de inspiração, como disciplina, fraternidade e confiança.
Para os pais, é fácil identificar que o Santo Antônio é uma escola religiosa. O mesmo vale para o Marista, a Escola São Carlos ou o Colégio Imaculada Conceição. No segmento católico, adotam-se, em geral, nomes de santos. Mais difícil é atentar para esse detalhe quando a instituição é de direito privado e não é “batizada” com nomes religiosos ou títulos da igreja. O Dromos, que funciona na Asa Sul e no Sudoeste, é uma escola laica, mas tem missas e orações ecumênicas. No Centro de Ensino Alegria de Viver, em Taguatinga, os alunos de ensino fundamental e os do ensino infantil fazem uma oração pedindo um bom dia, uma boa aula e benção todos os dias.
O mesmo ocorre no Instituto de Educação Inédito, também localizado em Taguatinga. Lá, às segundas-feiras durante a hora cívica, a meninada reza um Pai Nosso, que é considerada pela direção uma oração universal e se encaixaria em todas as crenças.
Carta Magna
A Constituição do Brasil de 1988 é a sétima desde a independência do país (alguns juristas consideram a ampla Emenda Constitucional de 1969 um nova carta magna, mas ela não entrou como tal nessa listagem). A lei fundamental e suprema do Brasil serve de parâmetro de validade a todas as demais leis e se situa no topo do ordenamento jurídico nacional.
Facultativo aos estudantes
Pouca gente sabe, mas o ensino religioso é obrigatoriamente oferecido nas escolas públicas. De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996, o ensino religioso passou a ser parte integrante da educação básica das escolas municipais, estaduais e federais como disciplina dos horários normais do ensino fundamental — “assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo” — cita a lei. A regra, no entanto, é facultativa aos alunos. Ou seja, quem não quiser assistir à aula de religião não precisa.
Na prática, os pais devem ser informados da oferta de ensino religioso no momento da matrícula do filho. Vale destacar que os sistemas de ensino de cada estado ou município regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. No Distrito Federal, existe uma comissão na Secretaria de Educação que trabalha na normatização da oferta.
Na Câmara dos Deputados, tramita um acordo internacional que pode colocar lenha na fogueira. No próximo dia 5, a Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional vota um acordo entre o Brasil e o Vaticano, relativo ao Estatuto da Igreja Católica. O texto prevê o ensino religioso em escolas públicas, mas, como se baseia em recomendação do Vaticano, cria uma tendência católica no ensino. O Estatuto seria votado na semana passada, mas foi adiado por causa da polêmica.
GLOSSÁRIO
Entenda as definições das escolas:
Laica
É o colégio cuja proposta pedagógica não tem influência de qualquer prática religiosa. No caso de instituições particulares, também é a de sentido estrito, ou seja, instituída e mantida por uma ou mais pessoas físicas ou jurídicas de direito privado.
Religiosa
Engloba as escolas particulares confessionais ou filantrópicas que, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), recebem benefícios, como isenção de alguns impostos. Esses estabelecimentos têm aula de ensino religioso na grade de horários.
Com práticas religiosas
São as escolas laicas, ou seja, as com fins lucrativos, mas que — dentro da rotina escolar — incluem orações ecumênicas em salas de aula, nas reuniões de alunos ou em horas cívicas.
Fonte: Badauê online
O Brasil, as unidades da Federação e os municípios são laicos. O artigo 19 da Constituição proíbe o estabelecimento de qualquer relação de dependência ou até aliança de governos e órgãos públicos com igrejas ou cultos religiosos. O direito individual de ter ou não religião também aparece na mesma lei. O artigo 5º garante como “inviolável a liberdade de consciência e de crença”. A realidade é bem diferente, no entanto, para os pais de crianças e adolescentes do Distrito Federal quando em jogo está a escolha da escola particular para os filhos.
A instituição privada tem direito a adotar publicamente uma crença religiosa ou se vincular a uma congregação — católica ou protestante. Mas precisa se submeter à lei máxima, ou seja, não pode restringir o acesso a estudantes que professem a mesma fé nem impor suas convicções a pais e alunos. Levantamento feito pelo Correio com todas as 152 escolas filiadas ao Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do DF (Sinepe-DF) mostra que 72% dos colégios só de ensino fundamental ou de ensinos fundamental e médio têm práticas religiosas (o índice representa 56 instituições). Na sondagem, foram descartadas as escolas de ensinos infantil e profissionalizante. Com o corte, avaliaram-se as ofertas de 78 centros de ensino, considerando apenas as matrizes. É o caso do Colégio La Salle, que aparece quatro vezes na lista de filiados no Sinepe, mas apenas uma no levantamento do Correio.
Em quase metade dos casos, a própria instituição se define como confessional — a que elege publicamente o credo — e filantrópica. No restante, a palavra de Deus aparece de forma discreta em uma oração no início da aula ou na hora de comer a merenda. A relação de religião e educação incomoda o funcionário público Arthur Passos da Silva, de 45 anos. “Queria um colégio perto de casa e de qualidade. Só encontrei escolas religiosas e acabei matriculando o David em uma escola mais longe”, conta o pai do adolescente de 14 anos. “Hoje, ele vai e volta de transporte escolar”, completa.
A postura mais radical do pai é rara, de acordo com o professor de ensino religioso do Colégio Santo Antônio Francisco de Matos Barros. “A religião é uma forma de passar valores importantes para a meninada. Nem todas as famílias com crianças matriculadas aqui são católicas”, diz o professor. “Explicamos aos pais que o conteúdo ajuda a formar um cidadão melhor.”
Sem proselitismo
Nas aulas de ensino religioso do colégio são tomados alguns cuidados. Nem Francisco nem os outros dois professores de ensino religioso usam correntes com medalhas de Nossa Senhora ou qualquer imagem de santo. Também não é comum vê-los falando do catolicismo. A lei de Diretrizes e Bases da Educação proíbe o proselitismo, ou seja, não permite que docentes façam propaganda de religiões em sala de aula. Na lei, porém, não há referências a imagens ou textos de orações espalhados pelos centros educacionais. No Colégio Santo Antônio, por exemplo, cartazes com o desenho de um frei franciscano apresentam palavras de inspiração, como disciplina, fraternidade e confiança.
Para os pais, é fácil identificar que o Santo Antônio é uma escola religiosa. O mesmo vale para o Marista, a Escola São Carlos ou o Colégio Imaculada Conceição. No segmento católico, adotam-se, em geral, nomes de santos. Mais difícil é atentar para esse detalhe quando a instituição é de direito privado e não é “batizada” com nomes religiosos ou títulos da igreja. O Dromos, que funciona na Asa Sul e no Sudoeste, é uma escola laica, mas tem missas e orações ecumênicas. No Centro de Ensino Alegria de Viver, em Taguatinga, os alunos de ensino fundamental e os do ensino infantil fazem uma oração pedindo um bom dia, uma boa aula e benção todos os dias.
O mesmo ocorre no Instituto de Educação Inédito, também localizado em Taguatinga. Lá, às segundas-feiras durante a hora cívica, a meninada reza um Pai Nosso, que é considerada pela direção uma oração universal e se encaixaria em todas as crenças.
Carta Magna
A Constituição do Brasil de 1988 é a sétima desde a independência do país (alguns juristas consideram a ampla Emenda Constitucional de 1969 um nova carta magna, mas ela não entrou como tal nessa listagem). A lei fundamental e suprema do Brasil serve de parâmetro de validade a todas as demais leis e se situa no topo do ordenamento jurídico nacional.
Facultativo aos estudantes
Pouca gente sabe, mas o ensino religioso é obrigatoriamente oferecido nas escolas públicas. De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996, o ensino religioso passou a ser parte integrante da educação básica das escolas municipais, estaduais e federais como disciplina dos horários normais do ensino fundamental — “assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo” — cita a lei. A regra, no entanto, é facultativa aos alunos. Ou seja, quem não quiser assistir à aula de religião não precisa.
Na prática, os pais devem ser informados da oferta de ensino religioso no momento da matrícula do filho. Vale destacar que os sistemas de ensino de cada estado ou município regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. No Distrito Federal, existe uma comissão na Secretaria de Educação que trabalha na normatização da oferta.
Na Câmara dos Deputados, tramita um acordo internacional que pode colocar lenha na fogueira. No próximo dia 5, a Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional vota um acordo entre o Brasil e o Vaticano, relativo ao Estatuto da Igreja Católica. O texto prevê o ensino religioso em escolas públicas, mas, como se baseia em recomendação do Vaticano, cria uma tendência católica no ensino. O Estatuto seria votado na semana passada, mas foi adiado por causa da polêmica.
GLOSSÁRIO
Entenda as definições das escolas:
Laica
É o colégio cuja proposta pedagógica não tem influência de qualquer prática religiosa. No caso de instituições particulares, também é a de sentido estrito, ou seja, instituída e mantida por uma ou mais pessoas físicas ou jurídicas de direito privado.
Religiosa
Engloba as escolas particulares confessionais ou filantrópicas que, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), recebem benefícios, como isenção de alguns impostos. Esses estabelecimentos têm aula de ensino religioso na grade de horários.
Com práticas religiosas
São as escolas laicas, ou seja, as com fins lucrativos, mas que — dentro da rotina escolar — incluem orações ecumênicas em salas de aula, nas reuniões de alunos ou em horas cívicas.
Fonte: Badauê online
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